De pau de arara a cadeira do dragão, Comissão da
Verdade lista 20 métodos de tortura
Gustavo Maia
Do UOL, no Rio
Do UOL, no Rio
10/12/201410h53
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Bernardo Soares/JC Imagem
Prática "institucionalizada", "sistemática" e
"massiva", a tortura foi adotada como política de Estado durante a
ditadura militar, e seguia métodos padronizados, aponta o relatório da CNV
(Comissão Nacional da Verdade), divulgado nesta quarta-feira (10). Com base em
documentos e em depoimentos de vítimas e de agentes do regime colhidos ao
longo dos últimos anos, a comissão listou 20 técnicas usadas por torturadores
em interrogatórios, entre elas o pau de arara, o uso da chamada "cadeira
do dragão", uma espécie de cadeira elétrica, e a "geladeira",
uma tecnologia de tortura de origem britânica.
O documento produzido após dois anos e sete meses de trabalho da CNV foi
entregue nesta manhã à presidente Dilma Rousseff, que integrava a VAR-Palmares
(Vanguarda Armada Revolucionária Palmares) e foi vítima de tortura na década de
1970. Um dos 18 capítulos do primeiro volume do relatório, com mais de 60
páginas, é exclusivamente dedicado a documentar a aplicação da tortura e seus
efeitos. Por meio de relatos detalhados, o documento revela todos os passos da
tortura praticada nos anos de chumbo, tanto física quanto psicológica.
Além dos métodos elencados abaixo, são citadas técnicas como queimar com
cigarros alguma região do corpo, arrancar com alicate pelos, dentes ou
unhas, deixar o torturado com sede, amarrar fio de náilon entre os testículos e
os dedos dos pés e obrigar a vítima a caminhar, e o espancamento.
O Brasil deve punir quem cometeu crimes na
ditadura?
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O texto relata o esforço da cúpula do regime para "evitar o
conhecimento público das denúncias, refutá-las sumariamente, e impedir
investigações". Também aborda a influência da Escola das Américas, no
Panamá, criada pelo Departamento de Defesa do Governo dos Estados Unidos, e da
assessoria do Reino Unido na adoção da tortura como política de Estado durante
a ditadura militar. Outro ponto explorado pelo relatório é a participação de
médicos e enfermeiros nos atos contra os presos políticos.
O relatório, no entanto, não apresenta um resultado próprio com relação
ao número de pessoas torturadas durante o regime. A CNV afirma no documento que
a investigação comprovou a mesma conclusão de levantamentos anteriores, como o
do projeto "Brasil: nunca mais", segundo o qual 1.843 pessoas foram
submetidas a tortura de 1964 a 1977, e do PNDH-3 (Terceiro Porgrama Nacional de
Direitos Humanos), da Secretaria de Direitos humanos da Presidência da
República, que estima em 20 mil brasileiros o número de torturados no período
ditatorial.
A Comissão Nacional da Verdade também reuniu as principais sequelas
oriundas das diversas modalidades de tortura: muitas das vítimas ficaram
mutiladas, cegas, surdas, estéreis, com danos cerebrais ou paralisias, entre
outras. Também foram listadas sequelas psíquicas, como paranoia e depressão,
que levaram alguns torturados a cometer suicídio.
A reportagem do UOL entrou em contato com o Ministério da Defesa,
que responde pelas Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica), mas o
órgão federal informou que não se pronunciaria sobre o conteúdo do relatório.
Por meio de sua assessoria de comunicação, o órgão informou ainda ter
colaborado com os trabalhos da comissão desde a sua criação. Já os
representantes do Clube Militar não foram localizados.
Métodos de tortura
listados pela Comissão da Verdade
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Pau de arara
O preso fica suspenso por um travessão,
de madeira ou metal, com os braços e pés atados. Nesta posicão, outros métodos
de tortura são aplicados, como afogamento, palmatória, sevícias sexuais,
choques elétricos, entre outros. A longa permanência no pau de arara pode gerar
problemas circulatórios nas vítimas. É um dos métodos de tortura mais
utilizados e conhecidos da ditadura
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Choque elétrico
Aplica-se descargas elétricas em várias
partes do corpo da vítima, preferencialmente em áreas como pênis ou vagina e
ânus; testículos e ouvido; dedos e língua. Amarra-se um polo em uma das partes
e coloca-se o segundo na outra. Diversos aparelhos são usados para aplicar os
choques, que podem provocar convulsões. A aplicação intensa das descargas causou
a morte de muitos presos políticos
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Cadeira do dragão
Coloca-se o torturado, nu, preso em uma
cadeira pesada, para que ele receba choques elétricos. Uma trava empurra suas
pernas para trás e seus pulsos são amarrados aos braços do objeto. Constitui-se
por uma poltrona de madeira, revestida com folha de zinco. Ao ser ligada à
corrente elétrica, os choques atingem todo o corpo, principalmente nádegas e
testículos, no caso dos homens
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Palmatória
Consiste no uso de uma haste de madeira
arredondada, com perfurações nas extremidades, de preferência na região da
omoplata, na planta dos pés e palma das mãos, nádegas, etc. O método pode
causar o rompimento de capilares sanguíneos, derrames e inchaço, impedindo a
vítima de caminhar ou de segurar qualquer objeto
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Afogamento
Derrama-se água --às vezes misturada a
querosene ou amoníaco-- ou outro líquido pelo nariz da vítima, pendurada de
cabeça para baixo. Outras formas consistem em vedar as narinas e introduzir uma
mangueira na boca da pessoa; mergulhar a cabeça do preso em um tanque ou balde;
ou amarrar uma corda sob os braços do torturado e lançá-lo em poços, rios ou
lagoas. Esta prática é conhecida como "pescaria"
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Telefone
Aplica-se uma pancada com as mãos em
concha nos dois ouvidos ao mesmo tempo. Uma das vítimas contou que chegou a
perder os sentidos após um "telefone". O método levou ao rompimento
dos tímpanos de diversos presos políticos e, em alguns casos, à surdez permanente
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Corredor polonês
O preso é agredido em meio a uma roda
de torturadores, com socos, pontapés e golpes de caratê ou instrumentos como
pedaços de pau, cassetetes, mangueiras de borracha, vergalho de boi e tiras de
pneu. O método também é conhecido como "sessão de caratê"
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Uso de produtos químicos
Trata-se da utilização de qualquer tipo
de produto químico contra o torturado, seja para pressioná-lo a fornecer a
informação desejada, por alteração da consciência, seja para provocar dor.
Entre as possíveis aplicações, estão jogar ácido no corpo da vítima ou derramar
álcool sobre feridas e em seguida ligar o ventilador
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Soro da verdade
O "soro da verdade", nome
dado ao "pentotal sódico", é injetado por via endovenosa, gota a
gota, no torturado preso a uma cama ou maca. A droga tem um efeito progressivo:
primeiro sedativo, depois de anestesia geral e, finalmente, de depressão
gradativa dos centros bulbares. O seu uso pode provocar graves efeitos
colaterais e até mesmo a morte, no caso de doses excessivas
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Tempero com éter
Consiste em aplicar uma espécie de
compressa embebida em éter em partes sensíveis do corpo, como boca, nariz,
ouvidos, pênis etc., ou introduzir buchas de algodão ou pano, no ânus ou na
vagina da vítima. Esta prática geralmente acontece quando o torturado está no
pau de arara. A aplicação demorada e repetida provoca queimaduras nas áreas
atingidas
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Injeção de éter
Consiste na aplicação de injeções
subcutâneas de éter, que provocam dores lancinantes. Normalmente, esse método
ocasiona necrosamento dos tecidos atingidos
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Sufocamento
O torturador obstrui a respiração da
vítima, produzindo sensação de asfixia. Tapa-se a boca e o nariz do preso com
materiais como pano ou algodão, para impedi-lo de gritar. O torturado sente
tonturas e pode chegar a desmaiar
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Enforcamento
O preso tem o pescoço apertado com uma
corda ou tira de pano, sendo por vezes levado ao desmaio
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Crucificação
Consiste em pendurar a vítima pelas
mãos ou pés amarrados em ganchos presos no teto ou na escada, deixando-a
pendurada. Enquanto isso, os torturadores aplicam choques elétricos ou usam a
palmatória, entre outros métodos
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Poço de petróleo
O torturado é obrigado a colocar a
ponta de um dedo da mão no chão e correr em círculos, sem mexer o dedo, até a
exaustão, enquanto recebe "pancadas, pontapés e todo o tipo de
violência"
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Latas abertas
Consiste em obrigar o torturado a se
equilibrar com os pés descalços sobre as bordas cortantes de duas latas
abertas, como as de leite condensado, por exemplo. Quando a vítima se
desequilibra e cai, os espancamentos se intensificam
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Geladeira
O preso é confinado, nu, em uma cela de
1,5m de altura, por horas ou dias, muitas vezes sem comida ou água. A porta
interna é de metal e as paredes são forradas com placas isolantes. Um sistema
de refrigeração alterna temperaturas baixas e altas. No teto, às vezes
acendem-se luzes coloridas em ritmo rápido, enquanto um alto-falante emite sons
de gritos e buzinas. O método é britânico
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Uso de animais
Expõe-se o torturado aos mais variados
tipos de animais, como cachorros, ratos, jacarés, cobras e baratas. Em alguns
casos, alguns deles foram introduzidos em partes do corpo da vítima
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Coroa de cristo
Coloca-se uma fita de aço em torno do
crânio, com uma tarracha permitindo que ela seja apertada. A prática resultou
na morte de Aurora Maria Nascimento Furtado, militante e guerrilheira da Ação
Libertadora Nacional, em 1972
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Churrasquinho
Consiste
em atear fogo em partes do corpo do preso previamente embebidas em álcool
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