“Escola sem Homofobia” – chamado por intolerantes de “Kit Gay”
Leonardo Sakamoto
11/02/2015 07:47
Parte do programa “Brasil sem Homofobia'' – lançado com o objetivo de
combater a violência contra gays, lésbicas, travestis, transexuais, entre
outros grupos – mirava na formação de educadores para tratar das questões de
gênero e da sexualidade em sala de aula.
Nesse contexto, material foi produzido para ser distribuído aos
professores. Mas, em 2011, grupos conservadores e representantes do
fundamentalismo religioso no Congresso Nacional fizeram uma chiadeira
irracional e o governo federal, com medo da sua imagem e em nome da
governabilidade, barrou sua impressão e distribuição.
Diziam que esse “Kit Gay'' iria estimular “o homossexualismo e a
promiscuidade''. Como se fosse possível um material didático forçar uma
orientação sexual ou uma identidade de gênero.
Como parte de uma excelente reportagem de Wellington Soares sobre
questões de gênero que está chegando, nesta quarta (11), às bancas, a revista
Nova Escola está disponibilizando para download a íntegra desse material
didático contra a homofobia – ou “Kit Gay'', para os intolerantes.
(A revista faz um golaço ao trazer em sua capa a história de um menino inglês, de
cinco anos, que foi impedido de ir às aulas por gostar de usar vestidos até que
se comportasse “de acordo com seu gênero''.)
A Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e
Transexuais, envolvida na elaboração do material, repassou o caderno com
instruções ao professor à Nova Escola por não acreditar que ele seria
desengavetado pelo governo.
Segundo a revista, o kit também contava com boletins informativos (aos
quais a reportagem não teve acesso) e vídeos que já estavam disponíveis na rede
– e seguem republicados ao final deste post.
Há poucas coisas tão absurdas quanto fazer uma campanha contra um
material didático produzido com o objetivo de combater o preconceito e a
discriminação contra determinados grupos sociais e a estimular a tolerância e o
entendimento de questões de identidade e de gênero.
O absurdo rivaliza, talvez, com a ação de parlamentares que colocam o
fundamentalismo religioso acima da garantia da dignidade, com a falta de
coragem do governo federal, que engavetou o material, e o comportamento de
colegas jornalistas que ajudaram a batizar esse material didático de “Kit
Gay'', reduzindo a complexidade da discussão e ajudando a reafirmar
preconceitos em nome da audiência.
Sugiro, portanto, que os
professores analisem o material e, se for o caso, o utilizem em seus
planos de aula.
Por fim, um comentário: diariamente, quando acordo, o calendário no
celular me mostra que estamos na segunda década do século 21. Mas a realidade,
ao longo do dia, me faz duvidar disso, transportando-me, muitas vezes, para os
momentos mais sinistros da Santa Inquisição.
É inacreditável que ações que ajudariam a promover a dignidade de grupos
historicamente atacados e vilipendiados, que deveriam também acontecer na
pluralidade do âmbito escolar, sejam interditadas dessa forma.
Atos de homofobia são praticados diariamente, algumas vezes resultando em
mortes. Muitas vezes a polícia, por mais que investigue, não encontra os
executores. Mas os ideólogos dessas ações estão por aí, evitando que a
tolerância seja entendida desde cedo pelas pessoas. Estão nas ruas, em templos,
no Congresso Nacional, em Assembleias Legislativa, em salas do Poder Executivo
ou mesmo do Judiciário, onde entrincheirados, defensores da discriminação, do
preconceito e da intolerância, fazem sua guerrilha particular. Ao travar
medidas que contribuiriam com a solução, ajudam na manutenção das condições que
geram o problema. São parte dele.
Supostos representantes dos interesses de Deus na Terra que afirmam
lutar pelo direito de reafirmarem suas crenças. Mas que droga de crença é essa
que diz que A é pior que B, gerando ódio sobre o primeiro, só porque A é
diferente?
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