Hoje na História: 1942 –
Olga Benário Prestes é deportada para Alemanha
Max
Altman | São Paulo - 23/04/2014 - 08h00
Militante comunista alemã, casada com o brasileiro
Luis Carlos Prestes, foi assassinada em um campo de extermínio
Em 23 de abril de 1942, Olga Benário
Prestes, militante comunista alemã de origem judaica, foi deportada para a
Alemanha durante o governo de Getúlio Vargas, vindo a ser executada pelo regime
nazista num campo de extermínio. Tendo vindo para o Brasil na década de
1930, para ser guarda-costas de Luis Carlos Prestes, Olga tornou-se sua
companheira, tendo com ele uma filha, Anita Leocádia Prestes.
Nascida em Munique, em 12 de fevereiro de
1908, Olga Gutman Benário era filha do advogado Leo Benário e
de Eugénie Gutman, que formavam uma família judaica alemã de classe média.
Ingressou no movimento comunista em 1923, aos 15 anos, filiando-se à KJVD
(Liga Juvenil Comunista da Alemanha). Pouco depois, mudou-se para Berlim
com o namorado, Otto Braun, em virtude de conflitos ideológicos com o pai,
membro ativo do Partido Social Democrata.
No clima político instaurado pela República de
Weimar e após o assassinato dos espartaquistas Rosa Luxemburgo e Karl
Liebnecht, Olga ascendeu dentro do movimento após os conflitos de rua contra as
milícias de extrema-direita no bairro de Kreuzberg. Foi presa no mesmo dia que
Braun, ambos acusados de alta traição à pátria. Ela foi logo solta, mas
Braun, não. Olga, então, planejou o assalto à prisão de Moabit, para
libertá-lo. Logo depois, os dois fugiram para a União Soviética, onde Olga, já
tida como quadro valioso, recebeu treinamento político-militar, trabalhando
como instrutora da Seção Juvenil da Internacional Comunista. Terminou o
relacionamento com Braun em 1931.
A Internacional Comunista havia seguido na
Alemanha, desde o fim dos anos 1920, uma política fundada na recusa de se
coligar com os social-democratas numa frente única contra o nazismo,
acusando-os de ter aprovado créditos para a Primeira Guerra Mundial,
assassinado as principais lideranças comunistas e contribuído para a ascensão
do nazismo. Com o fracasso dessa linha política, buscou compensá-la com o apoio
à revolução em diversos países.
Vinda para o Brasil
Luis Carlos Prestes, que desde 1931 residia na
União Soviética, foi, em 1934, finalmente aceito nos quadros do Partido
Comunista Brasileiro. Eleito membro da comissão executiva da Internacional
Comunista, volta ao Brasil, via Nova York, com documentos falsos, em
dezembro do mesmo ano, acompanhado de Olga Benário, que fingia ser sua mulher.
Seu objetivo era liderar uma revolução armada.
A política decidida no VI Congresso da
Internacional Comunista favorecia movimentos do tipo frente de esquerda tendo
por objetivo a realização de um programa de democratização política e de defesa
da independência nacional contra o imperialismo.
Prestes, devido a seu passado à frente da Coluna
Prestes, parecia a figura adequada para liderar o movimento no Brasil. Seria
acompanhado por um pequeno grupo de militantes, encarregados de auxiliá-lo na
preparação da insurreição: Inês Tulchniska, Abraham Gurasky, o alemão Arthur
Ewert, conhecido pelo codinome Harry Berger, sua mulher Elise “Sabo”
Saborovsky, o belga Leon Vallée, Boris Kraevsky, o argentino Rodolfo Ghioldi,
Carmen de Alfaya, Johann de Graaf, Helena Kruger, Pavel Stuchevski, Sofia Stuchskaia,
Amleto Locatelli, Mendel Mirochevski, Steban Peano, Maria Banejas, o
norte-americano Victor Baron e Marcos Youbman.
Prestes encontrou o movimento recém-constituído
denominado ANL (Aliança Nacional Libertadora), frente política de caráter
antifascista e anti-imperialista que congregava políticos, militares,
intelectuais, escritores, artistas, de esquerda, descontentes com o governo Vargas.
O movimento contestava o integralismo de Plínio Salgado, de cunho
filo-fascista. Prestes procurou, então, aliar o enorme crescimento da ANL à
retomada de contatos no meio militar para criar as bases a fim de tomar o poder
no Brasil.
Os preparativos insurrecionais caminhavam quando,
em novembro de 1935, um levante armado estourou em Natal. Prestes viu-se
obrigado a estender a insurreição para o resto do país. Porém, apenas algumas
unidades militares de Recife e Rio de Janeiro se levantaram. O governo
brasileiro logo controlou a situação e desencadeou forte repressão sobre os
setores oposicionistas.
Extradição
Em março de 1936, Olga e Prestes foram capturados
pela polícia. Olga foi levada para a Casa de Detenção e posta numa cela
junto com mais de dez mulheres, muitas delas conhecidas suas. Neste momento,
descobriu estar grávida. Logo vem a ameaça de deportação para a Alemanha.
Seria uma condenação à morte: além de judia, comunista. Começou
na Europa um grande movimento pela libertação de Olga e Prestes,
encabeçado por D. Leocádia e Lígia Prestes, respectivamente a mãe e a irmã de
Prestes.
O julgamento de Olga foi feito segundo as
formalidades da ordem constitucional, atendendo a um pedido
de extradição do governo nazista. A defesa da alemã pediu
um Habeas Corpus, argumentando que a extradição era ilegal, pois ela
estava grávida e sua deportação significaria colocar o filho de
um brasileiro sob o sistema de um governo estrangeiro. Havia também o
aspecto humanitário da permanência dela no país.
O Supremo Tribunal Federal, no
entanto, aprovou o pedido de extradição, Vargas negou o indulto e Olga foi
deportada para a Alemanha, juntamente com a amiga Sabo.
Olga foi transportada no cargueiro alemão La
Coruña. Quando o navio aportou em 18 de outubro de 1936, oficiais da
Gestapo já a esperavam. Não havia nenhuma acusação contra ela, pois o caso da
prisão de Moabit já prescrevera. No entanto, a legislação nazista autorizava a
detenção extrajudicial por tempo indefinido ("custódia protetora") e
Olga foi levada para Barnimstrasse, a temida prisão de mulheres, onde deu
à luz a filha. Anita Leocádia ficou em poder da mãe até o fim do período
de amamentação e, depois, em consequência das pressões da campanha
internacional, foi entregue à avó, D. Leocádia.
Olga foi transferida para o campo de
concentração de Lichtenburg em março de 1938. No ano seguinte foi transferida
para o campo de concentração feminino de Ravensbrück, onde as prisioneiras
eram sujeitas a experiências do médico Karl Gebhardt. No campo, ela
organizou atividades de solidariedade e resistência, com aulas de
ginástica e história.
Morte e homenagens
No Pessach de 1942, já com 34 anos, Olga foi
enviada para o campo de extermínio de Bernburg e assassinada na câmara de
gás em 23 de abril de 1942 com mais 199 prisioneiras, dentre elas suas amigas
Sarah Fiderman, Hannah Karpow, Tilde Klose, Irena Langer e Rosa Menzer. A
notícia de sua morte foi dada por meio de um bilhete escondido na barra da saia
de uma das presas.
Olga seria cultuada na Alemanha Oriental como
exemplo da mãe vítima do nazismo. É nome de rua na antiga Berlim Oriental
e em outras seis cidades alemãs. Sua efígie consta de moedas e selos, além de
ter dado nome a 91 escolas, creches, ruas e praças em cidades da antiga
República Democrática Alemã. No Brasil, Olga Benário também dá nome a ruas,
praças e escolas em várias cidades, incluindo São Paulo.
A primeira biografia de Olga foi escrita
por Ruth Werner e publicada na Alemanha Oriental em 1961. A tradução
para o português, do jornalista brasileiro Reinaldo Mestrinel, foi publicada
pouco depois. Fernando Morais publicou uma nova biografia em
1985, “Olga”, lançada pela Editora Ômega e depois pela Companhia das Letras,
tendo vendido mais de 170 mil exemplares.
Em 1989, a telenovela “Kananga do Japão”,
produzida pela Rede Manchete, retratou o casal Olga e Prestes, interpretados
por Betina Vianny e Cassiano Ricardo.
Na Alemanha, o cineasta turco Galio Yitanir
produziu o documentário “Olga Benario - Ein Leben für die Revolution"
em 2004. No mesmo ano foi realizado o filme “Olga”, baseado na
biografia de Morais e dirigido por Jayme Monjardim. A película recebeu três
prêmios no Grande Prêmio Brasileiro de Cinema de 2005. Em
1997, Jorge Antunes compôs a ópera “Olga”, com libreto
de Gerson Valle, que estreou no dia 14 de outubro de 2006 no Teatro
Municipal de São Paulo.