Maya Angelou e Basquiat
juntos: a infância sem
medo
Roberto
Almeida | Garatujas Fantasticas – fonte: operamundi
"As imagens de Maya com as pinceladas duras e
assustadoras de Basquiat, criam uma narrativa de que o medo e o terror está nos
olhos de quem os vê"
O viver com imensa intensidade une as histórias da
escritora Maya Angelou e do pintor Jean-Michel Basquiat. Maya, que morreu dia
28 de maio, aos 86 anos, escreveu nada menos que 7 (sete!) autobiografias. E
Basquiat, expoente da arte urbana novaiorquina, morreu precocemente em 1988,
aos 27 anos, quando experimentava o sucesso. A união artística de ambos, em um
raro livro para crianças, virou uma explosão de cores e sentimentos – mesmo que
escritora e pintor não tenham trabalhado juntos originalmente.
Life Doesn’t Frighten Me (ou A vida não me assusta), sem tradução ou edição no
Brasil, foi uma aposta de Sara Jane Boyers, da editora Stewart, Tabori &
Chang, de Nova York. Ela combinou o famoso poema de Maya, que reflete sua força
para encarar a luta por direitos civis, com as telas coloridas e, ao mesmo
tempo, soturnas de Basquiat. O resultado é tocante para qualquer idade. O livro
foi publicado em 1993 e, uma pena, não ganhou edições posteriores.
Maya transmite a ideia que a vida vale a pena, e que é preciso despojar
sentimentos negativos para construir uma sensação de plenitude e coragem. Para
isso, ela usa imagens diretas, como “dragões cuspindo fogo nos meus lençóis”,
“leões soltos”, “cães latindo em alto volume”, “fantasmões em nuvens”, “sombras
nas paredes / barulhos no corredor”, que aproximam o leitor de experiências
pessoais problemáticas.
Após cada verso que descreve o medo, ela repete: Life doesn’t frighten me at
all (A vida não me assusta nem um pouco).
As imagens de Maya, lado a lado com as pinceladas duras e assustadoras de
Basquiat, criam uma narrativa de que o medo e o terror está nos olhos de quem
os vê. E apontam para uma faceta alegre e pueril em desvendar suas origens.
Afinal, de onde vêm nossos medos? E como surge nossa coragem em decifrá-los? A
solução, para Maya, parece partir do princípio da aceitação da vida como um
grande campo de descobertas e enfrentamento.
Ela diz: “I
go boo / Make them shoo / I make fun / Way they run / I won’t cry / So they fly
/ I just smile / They go wild / Life doesn’t frighten me at all.” Ou, em tradução livre: “Eu protesto / Me livro do
resto / Eu me divirto / Eles fogem / Não vou chorar / Eles voam / Abro um
sorriso / Eles se desesperam / A vida não me assusta nem um pouco".
A ligação de versos como esses é quase umbilical
com as pinturas de Basquiat, especialmente se a gente exaltar a história do
pintor. Filho de um haitiano com uma porto-riquenha, ele desenhou e pintou
desde criança – seus professores já viam muito potencial no menino. Depois de
fugir de casa, ainda bastante jovem, começou a grafitar e sempre manteve um pé
na infância em suas obras.
Para ilustrar bem o encontro da força de Maya com a energia de Basquiat,
encontramos uma narração linda de uma garota de 10 anos do poema de Maya com as
imagens do livro. Vale a pena ouvir e admirar a combinação dos versos com as
obras. Uma bela homenagem a ambos, que fizeram história no campo artístico e
dos direitos civis.